Homilia da Paz
Do lado de Deus e com os irmãos obtém-se a paz
Oito dias depois do Natal do Senhor, o “Príncipe da Paz”, celebramos Santa Maria, a sua Mãe, em louvor de quem a ladainha, depois de lhe referir outras belas invocações ou atributos, encerra com a expressão “Rainha da Paz”. Imaginamo-la a segurar entre os braços, ao colo, o Deus-Menino e, consequentemente, a gerar-lhe tranquilidade e conforto. E ficamos com pena de não acontecer assim com as demais crianças do mundo. Bem gostaríamos que todas elas, as suas mães e os seus pais e todas as pessoas vivessem tranquilas e felizes, sem serem importunadas pelo barulho das bombas e dos canhões e pelos gritos e pavores da guerra. Quanto queríamos que todos vivessem sem medo e pudessem construir a «civilização do amor» e do desenvolvimento integral. Desejávamos que não passassem fome e frio, tivessem estruturas de saúde para se cuidarem e pudessem ir à escola e brincar. Mas, infelizmente, em muitas partes do mundo, isto não passa de um sonho.
Precisamente porque não é isto que se verifica, neste dia primeiro do ano civil, quando formulamos votos de prosperidade e de bem-estar aos nossos amigos, tomamos sólida consciência de que, sem a paz, não é possível qualquer género de bem. E, por vontade expressa da Igreja, até o designamos por Dia Mundial da Paz. Ele constitui um desafio que lançamos a nós próprios e ao mundo de construirmos a paz a nível das nossas relações interpessoais e mundiais, pois a situação global faz dela uma urgência. A paz, de facto, não pode esperar e a sua construção é possível. É com base nesta certeza que os cristãos têm de empenhar no seu processo.
Escutamos a primeira leitura. Moisés chama Aarão e os seus filhos e, a pedido do Senhor, manda-os abençoar o povo, com uma belíssima fórmula que ainda hoje usamos. Esta bênção, faz-se quando os fiéis se encontram reunidos na oração da manha, no templo de Jerusalém. Como que para dizer que, para ser abençoado, é indispensável estar na presença do Senhor. E o conteúdo da bênção é a paz: “O Senhor volte para ti os seus olhos e te conceda a paz”. É também a experiência dos pastores, de acordo com o Evangelho, que não foram a Belém ver um qualquer bebé, mas Jesus, cujo nome quer dizer “Deus salva”. Deus salva na Paz, como tinham cantado os anjos: “Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens por Ele amados”.
É este Jesus que tem de ser apresentado ao mundo, pois, no dizer do Apóstolo Paulo, “Ele é a nossa paz” (Ef 2, 14). Mas o mundo parece fechar-lhe a porta, como as hospedarias de Belém. Como tal, não encontra a paz. De facto, não deixa de ser significativo que, neste tempo de relativismo, à medida que a secularização avança, também a agressividade aumenta. Notamos isso a nível da rua, das escolas, na família, nas redes sociais, nas relações institucionais. E, obviamente, como resultado disto tudo, a nível das muitas guerras que que deflagram pelo mundo.
Disse há pouco que a bênção se faz na comunidade reunida para a oração. Dois elementos ressaltam: um grande grupo irmanado no mesmo objetivo e a mente e o coração voltados para Deus, a quem se rendem louvores. Creio bem serem estas as condições da verdadeira paz. Se não formos capazes de nos juntarmos, se apenas nos pensarmos como indivíduos e não como sociedade, se não nos colocarmos objetivos de desenvolvimento harmonioso e integral, se desprezarmos um Deus Pai que é fundamento de uma família de irmãos, se não nos voltarmos para Ele e fixarmos o nosso olhar no materialismo existencial, acontece o que todos sabemos: a guerra. Se virmos bem, esta é sempre uma opção contra «os outros» e contra Deus. Como diz o Papa Francisco na mensagem que nos enviou para este dia, “quando uma pessoa ignora a própria ligação com o Pai, começa a nutrir um pensamento de que as relações com os outros podem ser regidas por uma lógica de exploração, em que o mais forte pretende ter o direito de prevalecer sobre o mais fraco”. É bem verdade.
Para olharmos o futuro com esperança, o mesmo Papa Francisco, indica “três ações possíveis” para uma pacífica e amistosa relação entre as nações: o perdão das dívidas das mais pobres; o respeito pela vida humana, desde a conceção até à morte natural; e a criação de um fundo mundial para eliminar a fome e promova a educação. Para além destas, imensamente necessárias, eu proponho três âmbitos, a nível de proximidade: a educação catequética e a religioso-moral para todas as crianças, adolescentes e jovens; o fomento de ações de solidariedade social, mormente voltadas para os mais idosos e os pobres; e uma especialíssima atenção à família. É que, sem valores e sem abertura aos outros, a pessoa e a sociedade morre por implosão.
Entramos em Jubileu. Celebramo-lo como povo, como Igreja que tudo espera do seu Senhor. E como estamos habituados a tudo receber d’Ele, o nosso coração entrega-se-Lhe completamente. E isto é a esperança. Por isso, vivemos na alegria e na tranquilidade.
Caros cristãos, ao longo de todo este ano novo, “o Senhor vos abençoe e vos proteja. O Senhor faça brilhar sobre vós a sua face e vos seja favorável. O Senhor volte para vós os seus olhos e vos conceda a paz”. Feliz ano de 2025.
+ Manuel Linda 01 de Janeiro de 2025