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COMPREENDO E ACEITO

 

 

Vocação: ser para Deus e para os outros

Jubileu das Vocações

 

«Nenhum dos discípulos se atrevia a perguntar: Quem és Tu?», ouvíamos no evangelho de João. A identidade de Jesus é um dos temas fundamentais que atravessa os quatro evangelhos. «Quem dizem os homens que eu sou? […] e vós quem dizeis que eu sou?» (Mc 8,27.29) são perguntas que ouvimos na boca de Jesus.Para Jesus, é no ser que se condensa a questão essencial da Sua existência. Existência, esta, que Jesus concretiza no ser para o Pai e no ser para os outros.

Desta simples constatação, podemos retirar algumas consequências:

1) Primeira: como para Jesus, a nossa identidade deve ser para nós uma questão essencial. Não pensemos que dedicar tempo e energia a conhecer quem somos é um exercício meramente humano de autoconhecimento, sintetizado na pergunta «quem sou eu?». Recordemos Santo Agostinho: «Tarde te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova! Tarde te amei! E eis que estavas dentro de mim e eu fora, e aí eu te procurava… Tu estavas comigo e eu não estava contigo… Chamaste e clamaste e rompeste a minha surdez» (Conf., X, 27,38). Deus chamava Santo Agostinho, mas ele procurava-O fora, quando, na verdade, Deus era mais íntimo a Agostinho do que ele mesmo, como o próprio havia de reconhecer nas suas Confissões (Conf., III, 6, 11). Quer dizer que quando descemos ao mais fundo de nós mesmos, aí encontramos, para nossa surpresa, o próprio Deus. Eis que descobrimos, aí, o interlocutor por excelência para a pergunta essencial que nos levou a descer às profundezas do nosso ser. Assim, a pergunta essencial sobre a nossa identidade ganha um vocativo, alguém a quem nos podemos dirigir: «quem sou eu, Senhor?»
2) Segunda consequência: com esta pergunta dirigida ao Senhor, reconhecemos, talcomo Jesus, que existimos em relação com o Pai. Nenhum de nós foi, ou é, o princípio de si mesmo. Deus chamou-nos à vida, deu-nos a possibilidade de ser: «Nele nos movemos e existimos» (Act 17,28). Este é o primeiro passo essencial na dinâmica vocacional: reconhecer Deus, o dador da Vida, como o nosso amorosointerlocutor que nos amou primeiro. Sinal desse amor, Deus chamou-nos à vida e, portanto, só no diálogo amoroso com Ele podemos descobrir quem somos. E somos para Deus.
3) Terceira consequência: reconhecendo Deus como nosso interlocutor, reconhecemo-nos como parte ativa e livre neste diálogo. Cada um de nós tem um papel ativo e livre no reconhecimento de Deus e do seu filho Jesus. Não basta que o catecismo afirme Jesus como verdadeiramente Deus, como Ressuscitado, como o Vivente. É necessário que eu O reconheça. Que, como o discípulo amado, diga: «É o Senhor!»,para depois deixar tudo e saltar para o mar ao Seu encontro, como Pedro. É o salto para a amizade. E se Jesus me chama à amizade com Ele, que respondo eu? Que estou ocupado? Que não estou interessado? São respostas possíveis. Porém, também é possível responder afirmativamente e de modo livre, sem ser empurrado: «sim, Senhor, também eu quero ser Teu amigo», dando assim o salto para a amizade com Jesus.
4) Quarta consequência: como Jesus, também nós somos para os outros. Depois de tudo o que vos disse, esta consequência torna-se quase natural. Tendo experimentado a amizade de Jesus, surge uma pergunta candente: como posso colocar a minha vida ao serviço de Deus e dos outros? Trata-se da vocação individualíssima de cada um em particular. Ser casado, ser religioso, ser leigo consagrado, ser padre, são algumas das vocações que costumamos enumerar. São modos de sermos para os outros. Mas são possíveis outros modos. Cada um há deencontrar o seu lugar neste mundo, o seu lugar para este mundo. Para quem te chama o Senhor? Coloca-te à escuta. Faz silêncio. Como dizia o nosso Papa Francisco, que lembramos com saudade e encomendamos à misericórdia do Pai, na sua mensagem para a Semana de Oração pelas Vocações deste ano: «O silêncio da oração é indispensável para “interpretar” o chamamento de Deus na própria história e para dar uma resposta livre e consciente». Dá, por isso, espaço à oração, ao discernimento.Procura acompanhamento, junto de alguém que possa ser um bom interprete do chamamento de Deus para ti.
5) Quinta consequência: o ser de Jesus revela também o nosso próprio ser. A nossa identidade está em estreita ligação com a de Jesus. Se reconhecemos Jesus como o Senhor Ressuscitado, o Vivente, abre-se um novo horizonte na nossa identidade: também nós somos, existimos, para a Ressurreição, para a Vida, para a Esperança, para a vida em abundância. Este Jubileu das Vocações quer sublinhar esta dimensão essencial do nosso ser em Cristo: somos chamados à Esperança! Quer dizer que não somos apenas aquilo que os nossos olhos agora veem, pois agora vemos como num espelho, mas havemos de conhecer como somos conhecidos (Cf. 1 Cor 13,12). Na verdade, no nosso «homem velho» foi semeada uma semente de esperança que nos acalenta no caminho para o que haveremos de ser. De tal modo, que cada vocação é já um sinal de esperança. Como dizia o Papa Francisco, «cada vocação na Igreja – seja laical, seja ao ministério ordenado, seja à vida consagrada – é sinal da esperança que Deus nutre pelo mundo e por cada um dos seus filhos».

Por isso, com São Paulo exorto-vos «a caminhar em modo consentâneo da vocação à qual fostes chamados, com toda a humildade e gentileza, com magnanimidade, tolerantes uns com os outros no amor, apressados a manter a unidade de espírito nas amarras da paz; um corpo e um espírito, tal como também fostes chamados numa só esperança da vossa vocação; um Senhor, uma fé, um batismo, um Deus e pai de todos, que é sobre todos, por todos e em todos» (Ef 4, 1-6).

 

 

+ Manuel Linda
25 de abril de 2025