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“Ele ressuscitou e vive ao nosso lado”
   

“Ele ressuscitou e vive ao nosso lado”

Nota ao Povo de Deus da Diocese do Porto para a celebração da Semana Santa e Páscoa

 

Na longa história da Igreja, poucas vezes terá havido suspensão das celebrações coletivas da fé e, certamente, nunca terá acontecido em tantos países, em simultâneo, como nesta Quaresma e Páscoa. Não obstante a tristeza profunda que isso nos gera, tem de ser. É que a caridade cristã, neste momento, passa, fundamentalmente, por confinar o vírus e evitar mais contágios e sofrimentos.

Porém, mesmo que não possamos reunir o povo de Deus em assembleia santa para rememorar os acontecimentos centrais da nossa salvação e entoar os louvores do Deus Salvador, nem por isso deixaremos de celebrar esses mistérios e de nos darmos conta de que, não obstante tudo, o mistério de amor manifestado pelo Senhor Jesus é mais forte do que todos o vírus e todas as nossas angústias.

É, pois, sobre esta celebração que pretendo dirigir-me ao amado povo de Deus desta Diocese do Porto, com a síntese possível.

1. Uma Igreja doméstica

Ao longo dos três primeiros séculos e em todas as frequentes épocas de perseguição, nunca a Igreja deixou de celebrar o culto. Mas fazia-o nas casas familiares. Daí ficou-nos uma certeza: a primeira célula da grande Igreja é a família. Por isso, chamamos à família “Igreja doméstica”.

Com o andar dos tempos, passamos para a Paróquia muitas «responsabilidades» que eram típicas da família. Ganhamos em estruturas, meios e até na noção visível de que somos mesmo o “Povo de Deus”. Mas perdemos em responsabilização, em transmissão «quente» da fé, no efetivo exercício do sacerdócio comum dos fiéis.

O confinamento a que somos obrigados favorece a redescoberta desta dimensão doméstica da Igreja. Evidentemente, sem cortar com a Paróquia e a Diocese, de quem a família é «célula». Que todas as famílias cristãs da nossa Diocese sintam que são verdadeiramente Igreja.

2. Uma Igreja reunida

Por esta razão, com muito carinho, convido as famílias a fazerem a experiência da fé no seu interior. Particularmente aquelas que perderam o hábito da oração em conjunto. Não se pede muito. Mas, ao menos, uma leitura, um gesto, um afeto que lembre o que se celebra nesse dia. Há imensas páginas web que fornecem as leituras, concretamente a do Evangelho. Recomendo a oficial: www.liturgia.pt.

E que celebramos nestes dias? No Domingo de Ramos, fazemos memória da entrada de Jesus em Jerusalém e do início dos acontecimentos centrais da nossa fé. Nesse dia, costuma-se ler o longo relato da Paixão. Recomendo-o, pausadamente e com comentários, particularmente às crianças. Na quinta feira, de tarde, rememoramos a Última Ceia, a instituição da Eucaristia e do sacerdócio e o mandamento do amor fraterno, exemplificado no gesto do lava-pés. À noite, pensamos na prisão de Jesus e início do seu julgamento. Na sexta, tomamos parte no que sucedeu de dramático nesse dia, em Jerusalém: o Senhor é injustamente condenado à morte, crucificado no calvário e deposto no túmulo. O Sábado é um dia de introspeção e silêncio: o Senhor, verdadeiro Homem, aniquilou-Se até à morte. Por nosso amor.

À noite, iniciamos a solene Vigília pascal: preparamo-nos, espiritualmente, para o festivo anúncio da ressurreição percorrendo os principais momentos da nossa história da salvação. E a Vigília conduz para o Domingo de Páscoa, o “primeiro dia da Semana” que ficaria para sempre consagrado ao Senhor –o “Dia do Senhor”- porque «tocamos» com os sinais da ressurreição: os testemunhos dos que viram e ouviram.

3. Uma Igreja unida

Convido as famílias a unirem-se neste espírito de duas formas. Em primeiro lugar, «assistindo» às transmissões, mormente às televisivas, que são bem preparadas e liturgicamente muito dignas. Mas, se assim o quiserem, também podem acompanhar o Pároco, se ele usar alguma plataforma ou rede social: isso exprime sentido de pertença à Paróquia de que o sacerdote constitui como que o centro. Eu próprio celebrarei na quinta (17h30), sexta (15h00), Sábado (21h30) e Domingo (11h00). Essas celebrações serão transmitidas em https://www.facebook.com/Diocesedoporto/. No Domingo de Ramos, preside o senhor D. Vitorino na qualidade de Bispo que acompanha o setor da Juventude, que celebra o seu “Dia”. Também preside às Laudes de sexta e Sábado (10h00). Evidentemente, nestas celebrações, terei sempre presente as intenções dos meus diocesanos.

A outra forma de união passa pela criatividade familiar e paroquial. Por exemplo, enfeitar a mesa na ceia de quinta-feira; colocar uma cruz com um pano roxo, na varanda ou na sala, na sexta e no sábado; substituir esse pano por uma ornamentação de flores no Domingo de Páscoa e deixar permanecer assim durante toda a semana.

Algumas Paróquias vão realizar especiais gestos como, no dia de Páscoa, fazer circular uma cruz ornamentada pelas ruas da localidade, mas sem parar para não haver ajuntamento de pessoas. E eu próprio pedi para que se toquem os sinos das igrejas algumas vezes ao longo do dia. São formas simples de chamar a atenção que, não obstante tudo, estamos em sintonia espiritual.

4. Uma Igreja santificada

A secular experiência da Igreja uniu à celebração destes mistérios da fé a dimensão mais profunda de uma conversão espiritual, expressa nos sacramentos da Penitência e Eucaristia. Já que, este ano, não foi possível a celebração das tradicionais confissões paroquiais, convido todos e cada um a fazerem um exame de consciência a respeito da maneira como estamos a proceder para com Deus, com os irmãos, connosco próprios e para com a natureza. No final, devemos pedir perdão a Deus, numa oração pessoal que inclua a recitação do “ato de contrição”. E a confissão sacramental far-se-á logo que as circunstâncias o permitirem.

Como a maioria não poderá receber a comunhão sacramental, pode-se fazer o que se costuma designar por “comunhão espiritual”: uma oração na qual se exprime a vontade de receber o Corpo do Senhor e, como não é possível, se afirme o desejo de viver em união com o Salvador. Nas páginas da internet podem-se encontrar fórmulas válidas para despertar esses sentimentos.

5. Uma Igreja caritativa

A sociedade só funciona com o contributo de todos. Que seriam os hospitais sem os profissionais de saúde, os lares da Terceira Idade sem os funcionários, os sem-abrigo sem apoio de alimentação? Mas, além destes, mais ou menos cobertos em termos de «mão de obra», há sempre situações novas que reclamam carinho, solidariedade, presença, ajuda. Não a neguemos! Que os cristãos estejam sempre na linha da frente da preocupação pelos outros, particularmente dos vizinhos.

Inerente à celebração da quaresma também está a «partilha de bens», habitualmente designada por renúncia quaresmal e contributo penitencial. Como anunciei há tempos, este ano seria para a criação de «camas de emergência» para os sem-abrigo. Já que não foi possível realizar-se, veremos lá mais para a frente. De qualquer forma, pode-se, desde já, entregar na Paróquia que a fará chegar à Diocese. Peço, ainda, aos fiéis que não se esqueçam da sua contribuição económica para o sustento das pessoas e das estruturas paroquiais, como tão zelosamente costumam fazer.

6. Uma Igreja de esperança

Habitualmente, na pregação e nas nossas referências mentais, privilegiamos bastante as virtudes da fé e da caridade. Não podia ser de outra maneira. Mas não nos esqueçamos da esperança, virtude de igual importância e traço de união entre elas. Sim, o cristão é pessoa de esperança, pois sabe que não estamos sós e abandonados: a meta onde havemos de chegar é de salvação, pois Jesus Cristo é o Senhor da história.

Fiquemos com a consolação desta certeza, expressa pelo Papa Francisco na célebre «oração pela humanidade»: “No meio deste isolamento que nos faz padecer a limitação de afetos e encontros e experimentar a falta de tantas coisas, ouçamos mais uma vez o anúncio que nos salva: Ele ressuscitou e vive ao nosso lado. Da sua cruz, o Senhor desafia-nos a encontrar a vida que nos espera, a olhar para aqueles que nos reclamam, a reforçar, reconhecer e incentivar a graça que mora em nós. Não apaguemos a mecha que ainda fumega (cf. Is 42, 3), que nunca adoece, e deixemos que se reacenda a esperança”.

Porto, 3 de abril de 2020

O vosso Bispo e irmão,

+ Manuel Linda